domingo, 29 de julho de 2012

"Le Hermit - O Ermitão"

"- Agora, em meu próprio país, meus pés voltam a pisar.
O Ermitão saiu do barco e mal pôde se sustentar.
- Pergunte, pergunte Santo Homem:
O Ermitão esfregou a fronte.
- Fale - disse ele - diga que homem a mim está defronte.
- Embora esta carcaça tenha enrugado de tanta agonia, que me forçou a narrar meu conto, até que chegasse o dia.
- Desde então, a uma certa hora, a agonia retorna, e até o final desta narrativa, o meu coração chora!
- Eu passo como a Noite: de terra em terra. Tenho um estranho poder na fala.
- Assim que a face dele eu vir, saberei que deve me ouvir. E ensiná-lo é tudo o que posso pedir..."

domingo, 22 de julho de 2012

Quando conhecemos as coisas de verdade?

"Às vezes, sem causa aparente, vemos de verdade o mundo que nos rodeia. E essa visão é, a seu modo, uma espécie de teofania ou aparição, pois o mundo se revela para nós em suas dobras e abismos como Krishna diante de Árjuna. Todos os dias atravessamos a mesma rua ou o mesmo jardim; todas as tardes nossos olhos batem no mesmo muro avermelhado, feito de tijolos e tempo urbano. De repente, num dia qualquer, a rua dá para outro mundo, o jardim acaba de nascer, o muro fatigado se cobre de signos. Nunca os tínhamos visto e agora ficamos espantados por eles serem assim: tantos e tão esmagadoramente reais. Sua própria realidade compacta nos faz duvidar: são assim as coisas ou são de outro modo? Não, isso que estamos vendo pela primeira vez já havíamos visto antes. Em algum lugar, no qual nunca estivemos, já estavam o muro, a rua, o jardim. E à surpresa segue-se a nostalgia. Parece que nos recordarmos e quereríamos voltar para lá, para esse lugar onde as coisas são sempre assim, banhada por uma luz antiquíssima e ao mesmo tempo acabada de nascer. Nós também somos de lá. Um sopro nos golpeia a fronte. Estamos encantados, suspensos no meio da tarde imóvel. Adivinhamos que somos de outro mundo."

Octávio Paz

Acho que é por aí...

domingo, 15 de julho de 2012

Ode Marítima

"Ah, quem sabe, quem sabe,
Se não parti outrora, antes de mim,
Dum cais; se não deixei, navio ao sol
Oblíquo da madrugada,
Uma outra espécie de porto?"


Álvaro de Campos